Profissional de relações públicas por formação, Luciana Paulino trabalhou por oito anos com produtos turísticos, mas decidiu mudar a rota de sua carreira para focar em iniciativas que promovessem inclusão e equidade racial.
“No meu trabalho, eu ficava incomodada em ver que não tinha viajantes negros, como eu, e me perguntava porque isso acontecia. Levava essa conversa para vários grupos e cada um tinha sua opinião. Muitos achavam que a população negra não tinha poder aquisitivo para viajar. Com isso em mente, comecei a pesquisar sobre o tema”, relembra.
Para entender mais sobre a questão da equidade racial, Luciana deixou as agências nas quais trabalhava e se tornou colaboradora de um dos maiores festivais de cultura negra do mundo, a Feira Preta. “Foi muito bom porque eu consegui me aproximar do público e do business com o qual eu queria tratar, o que me trouxe um olhar mais sistemática para questões sociais e como funciona o consumo negro”, relata. “Tive experiências maravilhosas.”
Com o conhecimento adquirido, Luciana fundou uma plataforma digital, ao lado do sócio Guilherme Soares, que propõe uma visão mais inclusiva das experiências de viagem: a Black Bird. “Nela contamos a experiência de como é ser um corpo negro no mundo, com conteúdo inspirador, ligando turismo com conexão social. O turismo é uma ferramenta potente de autoestima de um povo e impacta diretamente na vivência, por isso criamos roteiros, contando a história de personagens invisibilizados. As histórias e viagens que contamos não fortalecem só o povo negro, mas o povo brasileiro”, explica.
A relações públicas acredita que muitas pessoas ainda ligam a ideia de viajar com entrar em um avião e cruzar o oceano. “Mas você pode viajar dentro do seu bairro. É uma forma de ativar o explorador urbano nas pessoas e nos seus arredores”, completa. Além de criar a plataforma, Luciana começou a atuar como consultora de equidade racial, o que a levou a fazer um mestrado de empreendedorismo social em Los Angeles, com bolsa da Fundação Lemann, organização da qual hoje faz parte como membro da rede de alto potencial.
“No Brasil me incomodava muito todos os empresários e pessoas ligadas a tomadas de decisão serem homens brancos. Além disso, eles olham para a base da pirâmide com um olhar muito assistencialista. Minha expectativa é que esse mestrado me ajude a fazer essa ponto entre o topo e a base da pirâmide e que as minorias sejam vistas como potências.”
“Eu sou da periferia de São Paulo e lá vejo jovens que são pura potência, mas precisamos criar um mindset no empreendedorismo social no Brasil como uma joia a ser lapidada, não um problema a ser resolvido”, opina.
Luciana percebe que é preciso traduzir os códigos e termos específicos do empreendedorismo de forma que todas as pessoas possam entender. “Muitas vezes, as coisas são ditas de forma muito elitista e ‘inglesada’ e isso afasta o público. É preciso entender que o seu grupo não necessariamente entende essa linguagem e que, para eles serem parte do processo, eles têm que estar sujeitos à ação. O empreendedor tem que envolver a comunidade para que ela tenha um papel estratégico no desenvolvimento de projetos voltados para eles. As pessoas são bem intencionadas, mas precisam conversar com o consumidor e entender o que ele precisa, antes de implementar qualquer iniciativa”, ressalta.
Quando finalizar os estudos, Luciana pretende voltar para o Brasil para trabalhar nos problemas de sua comunidade. “Estou muito animada porque o Brasil é um celeiro de impacto social. Somos uma nação amiga, acolhedora e que pensa em comunidade. No mestrado, sinto que estou ‘hackeando’ o sistema para passar o que sei para meus pares. Tem um teor inspirador em tudo isso. Muitas meninas me mandaram mensagem e estavam muito felizes e torcendo por eu estar fazendo ter feito esse mestrado. Inspirei muitas mulheres a acreditar que a mudança é possível”, celebrada.
A mestranda analisa que no Brasil ainda falta o engajamento das pessoas e a habilidade de aprender com erros para o empreendedorismo social decolar. “Eu estou otimista, apesar de algumas questões. A maior riqueza do Brasil é o povo brasileiro, que é capaz de fazer coisas incríveis quando são pressionados, que é o que ocorre com nosso contexto político e econômico no momento. Estamos fazendo, aos poucos, mudanças significativas”.
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