Startup e fintech são termos conhecidos de quem costuma acompanhar tendências de mercado e tecnologia. Mas um novo modelo vem ganhando força para quem trabalha com direito: as lawtechs (ou legal techs). Diretor executivo da Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs (AB2L), Daniel Marques explica que lawtechs (ou legaltechs) são empresas de tecnologia jurídica.
“Isso abrange de forma geral companhias que estejam gerando soluções tecnológicas para o mundo do direito, desde de startups até empresas consolidadas no mercado e multinacionais”, esclarece. Ele afirma que não existe uma diferença técnica entre os termos lawtech e legaltech, sendo uma questão de preferência de como as empresas preferem ser chamadas. Contudo, a expressão lawtech é mais popular na Europa, principalmente na Inglaterra, enquanto legaltech é mais comum nos Estados Unidos, conforme explica.
Daniel conta que o objetivo da associação é conectar o mundo jurídico ao universo 4.0. “Estamos passando para uma quarta revolução industrial com as novas tecnologias. Elas estão impactando todos os ramos da sociedade, entre eles o direito, que acredito ser a última fronteira da transformação tecnológica”, opina.
Surgimento das lawtechs no Brasil
Para o jurista, o direito é uma ciência tradicional por natureza porque busca conservar a ordem. “Por consequência, o advogado não gosta de tecnologia porque até hoje ela não foi necessária para o seu trabalho. Mas, no Brasil, temos mais de cem milhões de processos em andamento, 1,2 milhão de advogados e 1,3 mil universidades de direito, então temos uma estrutura jurídica complexa. É impossível continuar levando a justiça a todas as pessoas se não tivermos uma base de transformação tecnológica”, avalia.
CEO da lawtech de solução de conflitos judiciais e administrativos Melhor Acordo, Victor Aracaty acredita que as lawtechs ajudam departamentos jurídicos com atividades mais repetitivas, deixando os seres humanos com demandas mais estratégicas. “As lawtechs surgiram a partir de uma necessidade de mercado. Temos muitos processos, que às vezes são bem simples e poderiam ser resolvidos facilmente, mas inflam o sistema judiciário”, afirma.
Aplicando inovação
A Melhor Acordo ajuda empresas a realizar negociações automatizadas. “O sistema faz uma proposta para o autor da ação. Se ele aceitar, já é gerado uma resolução automaticamente. As partes assinam, nós protocolamos e processo já não existe mais. Isso leva uma média de dez dias. A empresa economiza com honorários dos advogados, despesas processuais e correspondência. Temos uma conta que economiza 75% do total dos gastos”, revela.
Para Victor, tanto a empresa como o consumidor são beneficiados. “O cliente não vai precisar esperar meses para resolver o problema e a empresa economiza com as despesas. Isso também ajuda a desafogar o sistema judiciário. A maioria das lawtechs do mercado querem beneficiar não só as empresas, mas também o consumidor”, aponta.
Contudo, a advogada Mariana Faria, integrante da comissão de inovação e gestão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Paraná, afirma que fazer inovação para o mercado jurídico, mesmo com o ‘boom’ de lawtechs, ainda é uma tarefa difícil. “Os advogados não estão acostumados a empreender, nem familiarizados com os termos ou o mindset da área. Pensar algo fora do modelo tradicional de escritório ainda é algo difícil de visualizar para a maioria”, aponta.
Protagonismo brasileiro
Mas mesmo escritórios tradicionais de advocacia estão percebendo a importância de investir em tecnologias para a área jurídica. É o caso da LPBK Advogados Associados que lançou um edital público para selecionar ideias inovadoras para o mercado jurídico. “Selecionamos cinco projetos para capacitar e dar mentoria duas vezes por semana, com profissionais do mercado. Alguns deles vão virar lawtechs no final”, explica Mariana, que é coordenadora executiva do projeto.
Para se afastar do modelo de resolução de problemas enraizado nos advogados, o projeto, chamado Programa de Inovação LPBK, está ensinando visões empreendedoras aos juristas. “Queremos propagar uma visão mais colaborativa, multidisciplinar e inovadora, com diversidade de times. As lawtechs são um mercado promissor e todo mundo está pensando em como inovar”, opina.
Para Daniel Marques, o Brasil está sendo e será o grande líder em tecnologia jurídica. “Se existe um lugar no mundo em que vai surgir uma lawtech ou legaltech unicórnio é o Brasil porque temos todos os tipos de problema jurídico. É o melhor lugar para gerar protótipo fazer experimentações que podem servir para o mundo todo. Temos observado um grande investimento e interesse nos produtos brasileiros”, afirma.
Iniciativas inovadoras
Em 2016, o atual presidente comissão de inovação e gestão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Paraná, Rhodrigo Deda, realizou o primeiro hackathon jurídico do Brasil. “Nosso objetivo é tornar a tecnologia mais familiar para os advogados e desenvolver uma cultura tecnológica para setor. As tecnologias os ajudam a atuar de maneira mais relevante para a sociedade”, garante.
Ele afirma que hackathon são importantes para criar uma sensibilização e fazer com que os juristas não se limitem a ser apenas usuários de tecnologias, mas também desenvolvedores. “Isso não quer dizer que eles precisam saber programar, mas tem que saber elementos essenciais e a lógica disso. O grande desafio do momento é fazer com que os advogados abracem esse processo. Precisamos democratizar o acesso à criação tecnológica para os advogados”, opina.
Atualmente, existem mais de 500 associados na AB2L, entre empresas, autônomos e escritórios parceiros. Confira o radar de lawtechs e legaltechs levantado pela associação pelo site.
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