Pepe Tonin, que trabalha com transparência no governo

Em idos de 2011, Pepe Tonin, então estudante de Direito da Universidade de São Paulo, acompanhou a implementação da Lei de Acesso à Informação (LAI) na Assembleia Legislativa de São Paulo, onde trabalhava como consultor técnico.

A lei, que é federal, obriga órgãos públicos a disponibilizarem informações como salários de funcionários e orçamentos e também a criar procedimentos para que os responsáveis respondam a demandas de cidadãos dentro de um determinado prazo. “Eu me apaixonei pela transparência e por sua capacidade de mudar uma cultura”, resume Pepe.

Formado em Relações Internacionais pela USP (o curso de Direito foi eventualmente trancado), ele está de de malas prontas para um mestrado em Administração Pública na University of Oxford, onde estudará como Lemann Fellow, programa de talentos da Fundação Lemann que apoia a formação de lideranças nas áreas de Educação, Gestão Pública e Saúde Pública.

Para tanto, pediu licença do cargo de chefe de divisão da Coordenação de Governo Aberto e Transparência do Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU), onde trabalha desde 2012.

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No dia a dia em Brasília, Pepe trabalha com o Portal da Transparência do Governo Federal – que teve 21,5 milhões de visitas em 2016 –, diariamente atualizando informações sobre gastos, receitas, servidores, orçamento e programas sociais do governo.

Também trabalha com a mesma lei que tanto o encantou há seis anos na capital paulista. Monitora fatores como tempo de resposta dos órgãos federais e o nível de transparência ativa em seus sites individuais, além de oferecer treinamentos aos funcionários que lidam com os pedidos e à membros da sociedade civil.

É uma lei simples e direta. “Qualquer um pode perguntar qualquer coisa, inclusive quanto um órgão gastou em paracetamol. O governo tem 20 dias para achar essa resposta. Em última instância, a demanda chega ao ministro do órgão”, explica.

Outra novidade que Pepe viu acontecer e que agora também está sob sua responsabilidade é a Política Nacional de Dados Abertos, que começou recentemente.

Ali, bases de dados brutos – sobre educação, saúde e meio ambiente, por exemplo –, ficam disponíveis para que a população faça seus próprios cruzamentos.

É o que Pepe chama de transparência radical, que pode ser utilizada por diversos segmentos da sociedade – de startups em busca de algum dado específico para seus negócios a acadêmicos que estudam o Zika Vírus.

“A transparência tem impacto na vida das pessoas”, fala. “Abrir dados significa, de alguma forma, empoderar o cidadão para que possa atuar naquele campo com informações confiáveis. Há um controle e cooperação maior por parte da sociedade para que todos possam trabalhar juntos.”

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Transparência no governo

Seu interesse por políticas públicas surgiu durante sua primeira graduação, em RI, concluída em 2009. “Eu já estava curioso sobre como funciona a transformação social por meio do estado”, lembra-se.

Em um intercâmbio para a Università di Bologna, na Itália, onde estudou como parte da rede Líderes Estudar da Fundação Estudar, aprofundou seus estudos em ciências políticas e direitos humanos.

Na volta, decidiu que precisaria fazer Direito para entender melhor como o estado funciona. Começou a segunda faculdade em 2011, mesmo ano em que começou a entender, na prática e na ALESP, como o governo funcionava.

No meio tempo, já com o tema transparência no radar, encontrou um concurso público da CGU, órgão responsável pela defesa do patrimônio público e pela transparência da gestão, e tirou um mês de férias para se preparar para a prova.

Em 2012, trancou a graduação em Direito e começou a trabalhar em Brasília.

Logo no início, coordenou os programas Brasil Transparente, criado para auxiliar cidades e estados na implementação de transparência, e Olho Vivo No Dinheiro Público, que formou lideranças da sociedade civil para que pudessem praticar o controle social de recursos públicos.

Ao longo de 2016, coordenou o 3º Plano de Ação brasileiro, resultado da parceria internacional Open Government Partnership, em que países-membros devem apresentar novos planos para abertura de governo a cada dois anos.

O plano brasileiro, que levou um ano para ficar pronto, envolveu mais de 100 pessoas, 27 oficinas de cocriação e resultou em 16 compromissos em campos variados, como proteção de direitos e inovação em serviços públicos.

1o Encontro de Governo Aberto, programa de transparência no governo da CGU[Pepe Tonin em meio a outros participantes do 1o Encontro Brasileiro de Governo Aberto / Foto: Acervo pessoal]

“Temos um núcleo e uma dinâmica para cada um desses projetos”, explica Pepe, que tem 22 pessoas na equipe.

Na rotina, há ainda análises e acompanhamento diário de indicadores, reuniões com a sociedade civil sobre ações conjuntas (o objetivo é que o maior número possível de cidadãos entenda como usar as ferramentas disponíveis) e conversas com outros níveis de governo, como prefeituras em busca de orientação.

Este é, aliás, um dos grandes gargalos brasileiros em relação à transparência governamental.

Embora o governo federal esteja bem colocado em rankings sobre o tema, explica Pepe, o gasto público acontece em grande parte nas prefeituras – e nem todas se adequaram às regras vigentes desde a aprovação da Lei da Transparência, que exige informações atualizadas em tempo real sobre receitas e despesas municipais.

“É importante ressaltar que há diferença entre transparência no governo federal e na gestão local, que é onde a política acontece”, fala Pepe.

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A carreira no setor público

Como qualquer trabalho, aquele no setor público também tem prós e contras. Entre os prós, Pepe destaca o impacto social imediatamente verificável e o alto nível dos colegas.

E quando enfrenta um contra conhecido pelos servidores públicos – o tempo exigido pela burocracia governamental para aprovar algo –, se lembra da frase de um amigo: não confunda paisagem com problema.

“Se você começa achando que tempo é um problema, fica louco. É uma situação que tem suas razões de ser e é preciso aprender a contorná-la sem perder a calma”, aconselha.

Não foi uma situação que o surpreendeu. Antes de ingressar na carreira (especificamente a de auditor federal de controle interno), Pepe fez questão de conversar com profissionais que já atuavam no CGU para entender como era o trabalho diário.

“É preciso se enxergar lá dentro”, aconselha.

Aos interessados, ele também indica que estudem outras portas para a gestão pública, como organizações internacionais e a ONG Vetor Brasil, que escolhe trainees de alto impacto para trabalhar na gestão pública. (E que está com inscrições abertas até 19//09.)

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Preparado para Oxford – uma instituição que escolheu tanto pela perspectiva global quanto pelo reconhecimento do Reino Unido como liderança em questão de transparência e inovação na gestão pública –, Pepe faz questão de desmistificar a ideia de que servidores públicos não avançam.

“O que me possibilitou ir para Oxford é a natureza do trabalho que faço. É desafiador e abre portas como essas”, afirma.

E foi graças ao trabalho na CGU que Pepe se tornou fellow em governo aberto pelo Programa de Fellowship de Governo Aberto das Américas pela Organização dos Estados Americanos (OEA), que seleciona jovens lideranças na América Latina.

“São jornalistas, ativistas da sociedade civil e servidores públicos que se destacam nessa área”, diz. Como fellow, ele viajou para a Washington D.C., onde teve um treinamento de dez dias, e desenvolveu um projeto em grupo por seis meses.

Seu grupo, composto também por fellows da Argentina, Uruguai e Guatemala, criou o projeto Abriendo Prisiones. A ideia é mudar o acompanhamento de violações de direitos humanos no sistema prisional por meio de mecanismos de transparência.

“Prisões são ambientes de opacidade em em que agentes públicos prestam poucas contas à sociedade e não há interesse político para fomentar informações sobre esses espaços”, explica. “Tentamos reverter essa lógica fomentando a integração desses espaços por meio de dados e acesso à informação e ao criar diferentes padrões de transparência.”

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Com uma checklist de dados mínimos em mãos, as prisões teriam que disponibilizar horário de funcionamento, telefones, comprovantes de compras para alimentação e dados sobre serviços de saúde e proteção à população LGBT, por exemplo.

Tais respostas servirão de base para um acompanhamento mais próximo por parte de outras entidades e facilitarão a identificação e correção de erros e violações no sistema carcerário.

Projetos como esse evidenciam o que motiva Pepe Tonin em relação à transparência: sua habilidade de obter respostas e mudar realidades. 

Outros exemplos práticos dessa aplicação destacados por ele são organizações como Artigo19, ONG que utiliza as leis para defender a liberdade de expressão e informação e QEdu, iniciativa que centraliza dados sobre educação no Brasil, e Observatórios Sociais do Brasil, em que cidadãos utilizam dados para controle social.

“Informação é poder e, quando falamos em transparência, falamos em equilibrar o poder entre governo e sociedade”, empolga-se. “Democratizar a gestão da informação é fortalecer a democracia.”

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