rafaela silva atleta

O tatame não foi a primeira opção de Rafaela Silva. Aos cinco anos, quando precisou escolher uma atividade na associação de moradores, queria jogar futebol – mas não tinha espaço para meninas. Acabou acompanhando a irmã na aula de judô. Na Cidade de Deus, comunidade carioca em que nasceu e cresceu, não ficar na rua estava de bom tamanho para sua família.

“Eu só gostava de lutar no meio da rua”, lembrou ela, hoje com 24 anos. “Era bem agressiva e brigava por qualquer coisa. Não me dar bala era motivo de briga. Ainda bem que isso foi canalizado no esporte.”

Em 8 de agosto, Rafaela ganhou sua primeira medalha de ouro olímpica. Foi também a primeira do país no Rio de Janeiro. Além de comemorar a conquista, a alguns quilômetros da comunidade e num estádio cheio, a judoca espantou um fantasma: a traumática desclassificação nos Jogos Olímpicos de 2012, após um golpe irregular em sua segunda luta. Era sua primeira Olimpíada.

Em Londres, ela não apenas perdeu o prêmio como teve que lidar com comentários violentos e racistas. “Tinha [tweets dizendo] que lugar de macaco era na jaula e não nas Olimpíadas, que eu era vergonha para a minha família”, lembrou. Entrou em depressão e considerou abandonar o esporte.

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A crise exigiu uma preparação psicológica intensa com uma coach motivacional para que mudasse de ideia. Em 2013, já de volta, ganhou seu primeiro ouro nos Jogos Panamericanos. No mesmo ano, tornou-se campeã mundial de judô. Foi a primeira brasileira a conquistar o título.

Quatro anos depois e mesmo com a medalha olímpica em mãos, a lembrança dos ataques ainda machuca. Logo após a luta e muito emocionada, Rafaela desabafou na televisão: “Todo mundo me criticou e falou que judô não era para mim, que eu era a vergonha da minha família, e agora sou campeã olímpica na minha casa”.

Rumo ao pódio Aos oito anos, Rafaela passou a treinar no instituto Reação, do também campeão olímpico Flávio Canto e celeiro de talentos na modalidade. A organização faz parte da Rede Esporte pela Mudança Social, que tem o apoio da ONU, e usa o esporte como ferramenta de inclusão.

Foi lá que o treinador Geraldo Bernardes, que comandou a seleção masculina brasileira em quatro Olimpíadas, enxergou seu potencial. Pagou seu quimono e suas refeições e exigiu em troca, além de trabalho duro, bom comportamento, boletins escolares e respeito aos mais velhos. Se não apresentasse o necessário, Geraldo não lhe permitia mudar de faixa – castigo insuportável para alguém tão competitivo como Rafaela.

“Batalhar é essencial porque não é fácil chegar lá”, resumiu Rafaela sobre sua trajetória. “Principalmente se você tem um sonho, tem que batalhar bastante. Mas vai chegar a hora de conseguir realizá-lo.”

Aos 21 anos, dois anos depois do trauma londrino, o investimento finalmente rendeu: tornou-se a primeira brasileira campeã mundial de judô. Três anos depois, a judoca dedicou ao mestre – assim como os atletas Thiago Braz e Isaquias Queiroz – seu título de campeã olímpica.

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“Quando ela chegou, vi que tinha um diamante muito bruto, mas que eu poderia lapidá-lo e fazer com que ela se tornasse uma pessoa melhor, não somente no esporte como na vida”, disse o mestre. “O Reação promove o desenvolvimento humano e social através do esporte e nós estamos provando que isso dá certo. O binômio esporte-educação é muito importante. Hoje, Rafaela faz faculdade e é campeã olímpica.”

Inspiração A brasileira também destacou a importância de projetos sociais para que jovens brasileiros expandam seus horizontes. Ela se lembra do ambiente agressivo que a rodeava, como tiroteios à luz do dia, traficantes em fuga e assassinatos perto de casa, e diz que não sabe onde estaria se não tivesse encontrado o judô. A mesma comunidade, no entanto, ajudou a moldar seu caráter.

“No esporte temos que ter garra, determinação e superação a cada lesão, a cada treino”, falou. “Na comunidade vivemos isso: temos que nos superar e ser determinados para conquistar alguma coisa. Por sermos negros, às vezes não conseguimos viver bem em uma sociedade preconceituosa.”

É frequente ver pequenos judocas do Reação quererem chegar mais perto da heroína, e Rafaela espera ser um exemplo para muitos outros pelo país. “Ver que uma menina que corria de bala perdida agora corre de pessoas tirando fotos e entrevistas é muito importante para mostrar que uma criança que saiu da comunidade pode conquistar o mundo”, falou. “Espero que eu sirva de espelho para essas crianças – pode ser o diferencial para poder aparecer outra Rafaela no próximo ciclo.”

Se alguma brasileira muito talentosa surgir até 2020 em sua categoria, porém, vai precisar competir pela vaga. Ainda na primeira rodada com a imprensa, com as borrachas do aparelho fixo verdes e amarelas e a medalha no peito, Rafaela revelou que seu novo sonho passa pelo Japão, terra natal do esporte que tanto ama: já quer outra vitória.

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