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“Para ter sucesso como mulher negra no mercado de trabalho, você precisa ter muita coragem”

Dilma Campos mulher negra no mercado de trabalho

#negritude

 

Bailarina, atriz, diretora artística, dentista, executiva e empreendedora. Essas foram as profissões pelas quais Dilma Campos passou em sua busca por um propósito profissional. De família humilde, a CEO da boutique de criatividade estratégica Outra Praia relembra sua trajetória, como se reinventou, conta os principais desafios de se estabelecer com sucesso como mulher negra no mercado de trabalho e como questões raciais e sociais afetaram o seu desenvolvimento.

O primeiro emprego de Dilma foi como assistente de um estúdio de balé, por volta dos 14 anos. “Comecei como bailarina e queria estudar balé fora do Brasil, mas não tinha condições financeiras para isso. Por conta desse sonho, conheci o mercado de eventos, que poderia me ajudar a viajar e fazer cursos de dança. Fui trabalhando cada vez mais na área e entrei em uma grande empresa de eventos como bailarina. Nela consegui me desenvolver, virar assistente de direção artística, e depois diretora”, relembra.

A jovem bailarina deixou de estudar aos 17 anos, após concluir o ensino médio, mas continuou a trabalhar na área de eventos. “Com 22 anos, fui fazer faculdade porque era o sonho do meu pai, que sempre dizia que conhecimento nunca era demais. Meu irmão, que é dentista, conseguiu uma bolsa de estudos para mim em odontologia, então eu decidi tentar. Continuei trabalhando com eventos, para pagar os materiais da faculdade”, conta. Foi nessa mesma época que Dilma participou do elenco do programa Castelo Rá-Tim-Bum, como Patativa.

O chamado ao empreendedorismo

Dilma chegou a fazer uma especialização em periodontia, enquanto conciliava os estudos com o trabalho em eventos. Mas ao final do curso, precisou escolher em qual área realmente queria atuar. “Recebi uma proposta de uma grande empresa de eventos e acabei aceitando. Larguei a odontologia e fui me aventurar pelo mercado de eventos. Passei por grandes empresas até que na última tinha um questionário para você entender o quanto você tinha uma alma empreendedora, e tudo que eu fazia dava que eu era empreendedora”, aponta.

A então diretora chegou em um momento da carreira em que percebeu que ao seu lado não havia outras mulheres negras no mercado de trabalho. “Eu olhava níveis acima e abaixo e não tinha nenhuma igual. Foi o momento em que eu me perguntei o que eu estava fazendo ali. Percebi que não ia conseguir crescer, apesar da minha vasta experiência, enquanto outras pessoas conseguiam evoluir. Foi quando resolvi empreender, aos 34 anos”, recorda.

Por meio de uma sociedade, Dilma criou seu primeiro empreendimento D’Magrella, empresa de produção de eventos. A tentativa não deu certo e a ex-bailarina decidiu enfrentar o desafio sozinha. A empreendedora analisa que suas várias experiências podem fazer parecer que ela “atirou para todos os lados”, mas Dilma afirma que a questão racial está muito ligada às suas escolhas. “A mulher negra no mercado de trabalho pode até chegar no mesmo patamar que os demais, mas um pouco mais tarde. Justamente porque o caminho dela é mais cheio de obstáculos”, observa.

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O negro no mercado de trabalho

Ao se ver como mulher negra empreendedora, Dilma ainda sentia falta de semelhantes ocupando os mesmos espaços que ela. “Eu tive que me redescobrir como mulher negra para responder uma pergunta que eu fazia: cadê as outras mulheres negras que não estão aqui do meu lado? E para a minha tristeza eu descobri que não tinha mesmo negras empreendendo e tendo um certo nível de faturamento para receberem destaque. Depois de um passado escravagista, a gente ainda não conseguiu trazer uma igualdade entre as pessoas periféricas, que em sua maioria são negras”, lamenta.

Ela analisa que o mercado de trabalho melhorou bastante nos últimos anos na questão de diversidade, mas que ainda há muito a ser feito. “Mas quando olhamos essa melhora nos números, ainda é um percentual muito pequeno e que vai demorar a trazer uma igualidade racial. É preciso entender que não é um problema só de meritocracia, mas também uma questão social. Para ter sucesso como mulher negra no mercado de trabalho, você precisa ter muita coragem. Também devo muito a minha família por colocar na minha cabeça que eu podia ser o que eu quisesse, desde que eu estudasse muito e que eu era merecedora de frequentar qualquer lugar”, aponta.

Dilma relembra que desde a infância seus pais incentivaram ela e os irmãos a se dedicarem cinco vezes mais que os demais. “Porque eles temiam que não fossemos contratados, por sermos negros e de família humilde. Um nove não era o bastante porque para eles significava que eu estava desempregada. Com o dez, talvez eu tivesse alguma chance. Tínhamos que ser os melhores da sala. Minha família entendia muito bem que o estudo era o catalisador de tudo. Isso norteou muito nossas vidas, além do pensamento de que não se abater ou se menosprezar por ser diferente das outras pessoas. Se permitir sonhar em chegar lá é um passo muito importante”, indica.

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Ela ainda aponta que como mulher negra no mercado de trabalho ela não tem a possibilidade de errar. “Para que outra pessoa possa trilhar o mesmo caminho que eu, gerando empatia para quem vem depois de mim. A responsabilidade sobre nós é muito maior. Não se tem a chance de errar. por isso o negro ocupa uma cadeira muito desconfortável nas organizações. Tudo que fazemos reflete em pessoas que começaram em situações similares. Se a gente começar pela igualdade na educação, começamos a poder pensar se a meritocracia pode existir um dia”, observa.

 

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A CEO ressalta que os negros foram colocados à margem da sociedade com o processo do fim da escravidão. “Foram largados na rua. Ninguém se preocupou em ajudar. Se você não tem empatia dos outros, você não acha que merece aquilo. Ainda temos que mudar muita coisa para achar essas mulheres negras que podem empreender e ocupar cargos de liderança. Porque hoje vemos uma, duas ou três, em um Brasil de 53% de negros que consome absurdamente e ainda assim não se vê representados nas ações que as empresas fazem. Precisamos discutir mais o racismo estrutural”, incentiva.

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