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Como esse brasileiro tornou-se coordenador de crédito do maior banco da China

Paulo Cunha no escritório brasileiro do ICBC, um dos maiores do mercado financeiro

No primeiro dia das operações brasileiras do Banco Industrial e Comercial da China (ICBC), o maior banco chinês e também maior do mundo em ativos, Paulo Cunha estava lá.

Era setembro de 2013 e a equipe contava com apenas 30 funcionários, dez deles chineses. Com quase três décadas de carreira, Paulo, o primeiro funcionário nativo contratado, tinha aceitado o desafio de tocar todo o departamento de risk management ao lado do chefe chinês – afinal, eram só eles dois.

“Fora da China e, particularmente no Brasil, o ICBC é muito pequeno”, conta ele, que integra a Líderes Estudar, a rede de alto impacto da Fundação Estudar. “Por ser uma instituição financeira ‘start up’ e pelo fato dos chineses conhecerem praticamente nada do Brasil, tive que contribuir muito com a estruturação de todas as rotinas de crédito do departamento, políticas e procedimentos.”

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Hoje, com sete pessoas no time, ele é coordenador de crédito do ICBC no Brasil. Na rotina, o processamento de aprovação de créditos em comitês, a interação com outras áreas do banco, revisão de políticas e procedimento de créditos e visitas a clientes – todos pessoas jurídicas em diversos setores, como agronegócio, energia e serviços.

“Não é um banco de oportunidade, é um que busca estabelecer relacionamento de longo prazo”, explica Paulo. “Há intenção de crescer, mas com cautela.”

Para ele, estar em sintonia com os objetivos de sua instituição é a marca de um bom profissional, aquele que foca nas metas da companhia e entende que todos estão ali para levá-la para frente, não importa que cargo ocupem.

“Costumo dizer que, como qualquer outra empresa, o banco é como um barco com seus remadores. Se cada um rema em um ritmo e direção diferente, o barco fica girando em círculos e não sai do lugar. Todos têm que remar para o mesmo porto.”

Trajetória

Paulo se formou em Administração de Empresas pela Fundação Getulio Vargas, atraído pelas diversas oportunidades de atuação da área.

Em 1989, um ano após se formar, entrou no mercado financeiro através do programa de trainee do antigo Banco Holandês Unido, em São Paulo, e tomou gosto pelo setor.

No começo dos anos 2000, sempre na capital paulista e já como analista de crédito sênior, passou pelo britânico LLoyds TSB Bank e pelo também holandês Rabobank International, ampliando seu repertório internacional.

Em 2007, trocou de eixo para o mercado asiático, levando sua expertise em crédito para o Bank of Tokyo-Mitsubishi no Brasil, onde avaliou oportunidades para empresas brasileiras e japonesas durante cinco anos.

Em 2013, aceitou a proposta de ajudar a implementar o ICBC no país.

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A cultura corporativa de bancos asiáticos

Muito se fala sobre o cotidiano em bancos europeus e americanos no país – o Na Prática, por exemplo, oferece visões de quem está dentro do JP Morgan e do Goldman Sachs –, mas o que acontece em bancos asiáticos é menos conhecido, mesmo por quem é da área.

“Inicialmente, não foi fácil”, lembra Paulo. “Como um banco oriental, o Bank of Tokyo Mitsubishi era excessivamente burocrático, com infinitos processos e procedimentos como eu nunca tinha visto nos bancos anteriores.”

A adaptação inicial no banco japonês foi tão difícil que Paulo começou a buscar outras oportunidades no mercado. Com o tempo, no entanto, aprendeu a superar os obstáculos e se adaptar (e prosperar) naquela nova cultura.

“Fique lá entre 2007 e 2012, o que me ajudou a solidificar conhecimentos e conceitos que hoje me auxiliam”, diz.

O que Paulo não sabia (e estava prestes a descobrir) quando aceitou a proposta chinesa é que a proximidade regional de suas sedes era basicamente a única coisa que os dois bancos tinham em comum.

“Quando eu comentava com as pessoas que ia trabalhar em um banco chinês, todas diziam – inclusive eu mesmo – que, como eu já tinha uma boa experiência com um outro banco asiático, a adaptação seria fácil. Todos enganados”, diverte-se.

A cultura e a mentalidade chinesa, conta ele, eram completamente diferentes de sua vasta experiência internacional, que inclui contato com culturas corporativas dos EUA, Holanda, Alemanha, Japão e Reino Unido.

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Ele destaca a rigidez do horário de trabalho e a valorização do convívio familiar, além da disponibilidade constante que os chineses têm para aprender com os brasileiros. “Pedem muita opinião e não têm restrição à contratação de profissionais com mais ‘quilometragem’, que tenham bom conhecimento das práticas e costumes do mercado local”, conta.

Tanta conversa esbarra em um obstáculo bastante pertinente: a língua. “A comunicação sempre foi uma barreira grande, pois a língua de comunicação com os chineses é o inglês, que não é dominado por muitos deles.”

A criatividade na hora de transmitir ideias é posta à prova frequentemente, mas é crucial para que as decisões de todos sejam bem embasadas. Tão crucial, na verdade, que Paulo às vezes pede ajuda de alguém fluente em ambos os idiomas para traduzir algo mais importante.

Apesar de eventuais percalços idiomáticos, Paulo vê a fluência em inglês como absolutamente vital para quem quer trabalhar no mercado financeiro asiático ou qualquer outra região.

Outras características que destaca são boas relações interpessoais, um bom nível de conhecimento geral e capacidade de se adaptar a ambientes diversos – e a vontade de aprender, de novo e de novo.

“Além disso, se os planos são de construção e consolidação de uma carreira séria, acho que resiliência e paciência para não ser atropelado pela própria ansiedade ajudam muito”, aconselha.

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Desafios e oportunidades no mercado financeiro

Ao longo de suas três décadas no mercado, Paulo viu uma parcela grande de transformações, tanto na informatização do setor, que deixou os bancos mais próximos do usuário brasileiro, quanto no número de boas instituições disponíveis no país.

“Esse número foi drasticamente reduzido após a expansão no fim dos anos 1980 e início dos 1990, quando muitos bancos foram incorporados, comprados, fundidos ou mesmo extintos”, explica, citando ainda as compras recentes do Citi pelo Itaú e do HSBC pelo Bradesco. “Se hoje um profissional troca um banco por outro, não é difícil vê-lo retornar ao banco de origem após uma fusão ou aquisição.”

Quanto ao futuro dos profissionais do mercado financeiro, que anda em pauta com o crescimento de algoritmos e inteligências artificiais, ele vê grandes oportunidades para quem acompanhar atentamente as mudanças que a automação trará ao setor.

“As inovações aparecem com frequência e não vejo grandes dificuldades para aqueles que percebem que as mudanças são inevitáveis e querem participar delas”, opina. “A inteligência humana nunca vai ser completamente dispensada. De alguma maneira, a atuação do homem vai ser sempre necessária.”

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