David Velez teve a ideia para o Nubank, uma fintech emissora de cartões de crédito, logo que chegou ao Brasil. O colombiano levou seis meses para conseguir abrir uma conta de banco e ficou impressionado com o tratamento nas agências. “Você precisa colocar todos os objetivos metálicos num armário, passar por portas à prova de balas… A experiência do cliente é a experiência de um criminoso!”, ri.
Recém-chegado dos Estados Unidos e prevendo (corretamente) que muitos gostariam de ter outra opção bancária, começou a investigar as possibilidades de atuar no setor financeiro.
“E ouvi muitas frases repetidas, como ‘no Brasil não dá’ ou ‘no Brasil não pode’”, lembrou ele em um painel sobre empreendedores estrangeiros no CEO Summit 2016, organizado pela Endeavor. “Diziam que reguladores e bancos não deixariam, que as taxas seriam impossíveis e todos – sem exceção – falaram que eu não ia conseguir começar. Há muita convencionalidade sobre como essas coisas deveriam ser aqui.”
Como Velez contou em entrevista ao Na Prática, ele foi buscar os investimentos necessários no Vale do Silício. Hoje, o Nubank tem centenas de milhares de clientes e uma imensa fila de espera.
“Há muitos desafios para um estrangeiro, mas são mais oportunidades – se fosse difícil todo mundo faria”, resumiu o americano Brian Requarth, cofundador do portal de imóveis VivaReal. “Comecei com nenhum dinheiro e, quando você não tem meios financeiros, precisa ser muito criativo – e ter pessoas que te apoiam é fundamental.”
O terceiro convidado, o húngaro-alemão Mate Pencz, que toca a gráfica online Printi, se lembra de dividir um apartamento no Brasil com outros dez expatriados – ninguém conseguia reunir a papelada toda para alugar um.
“É preciso navegar a burocracia e fazê-la funcionar para você porque depois de ultrapassar os obstáculos fica mais fácil”, disse. “Abrir uma conta e encontrar uma casa são coisas difíceis e funcionam quase como um processo de seleção!”
Cultura e oportunidades Os três gostaram do que encontraram em termos de capital humano no país. “Ficamos muito surpresos com a qualidade da execução”, falou Pencz. “O que trazíamos para a mesa como fundadores era nossa visão e estar lá para pensar fora da caixa, disrupcionando o status quo. Nosso negócio é quebrar paradigmas nesse segmento e, uma vez feito isso, há muito talento para executar.”
A adaptação para a cultura brasileira de trabalho – tema sobre o qual Fábio Coelho, diretor-geral do Google no país, já falou sobre em um bate papo com o Na Prática – também entrou em pauta.
“Questione essa ideia de que os brasileiros se comportam de certa maneira porque eles vão te surpreender se você desafiar essa mentalidade”, disse Velez. Ele dá um exemplo: o famoso atraso. “Assim que criamos uma cultura de começar pontualmente e terminar pontualmente, as pessoas começaram a chegar no horário. Trata-se de criar incentivos e uma cultura corporativa.“
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Para incentivar o sentimento de dono dos funcionários, por exemplo trouxe de fora a ideia de oferecer ações do Nubank com a contratação. “Não existe essa de chefe e empregado, você é parte da empresa.”
Requarth apontou como ponto negativo a disposição hierárquica das empresas no Brasil. No Vale do Silício, por exemplo, as empresas são horizontalizadas de tal maneira que um estagiário pode testar, errar e ter impacto.
“Aqui me respondem: ‘Ah, mas foi você que mandou’. Então determinamos um valor que é: ‘Não faça coisas que você acha que são estúpidas’. Se você achar que é algo idiota, me diga e a melhor ideia ganha”, falou. “É preciso ouvir as pessoas e empoderá-las, porque a hierarquia pode ser muito perigosa.”
Pecz concordou. “Damos mérito se o trabalho for bem feito e os indicadores de performance forem bons e a diferença-chave desse empoderamento é que as pessoas começaram não só a me trazer ideias mas a sentir mais orgulho do que faziam”, falou. “Elas sentem que estão contribuindo. É algo que achei que estava faltando no mercado.”
Futuro Donos de negócios que estão se consolidando no país, eles não estão aqui por acaso.
“O Brasil é um oceano azul profundo e um dos melhores mercados para se investir”, contou Pencz. “Uma base estável aqui pode se tornar uma plataforma de lançamento para negócios globais – aqui há o DNA dos mercado emergentes, como Sudeste Asiático e África. Com uma máquina eficiente e escalável, você pode, sim, ter essa ambição.”
Todos trabalham quando e como podem para fortalecer o ecossistema de empreendedorismo brasileiro. Requarth empresta um andar de seu prédio em São Paulo para startups, Velez é investidor anjo e conselheiro de outras, como a Biva, e Pencz, que está criando um fundo de investimentos, acredita em compartilhar sua trajetória e criar uma cultura colaborativa.
Os três também concordam com o seguinte: não escute tanto os outros. “Vim para o Brasil em 2008 e me disseram que eu era louco. Um ano depois, quando o país estava em todo lugar, de repente eu era um gênio – e em 2014 era burro de novo”, ri Requarth.
“Se você consegue ter sucesso no Brasil, conseguirá em qualquer lugar”, conclui Pencz. “É um dos mercados mais difíceis do mundo, então os profissionais precisam se orgulhar de trabalhar bem num sistema desses.”
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